Introdução
Registro, documentação ou necessidade de expressão, sacra ou profana, o fato é que a incisão ou gravado sobre superfícies rijas está presente desde que se conhece a história do homem. É de se supor que o esforço de apropriação e revelação de seu universo, milhares de anos antes da invenção do papel e da imprensa, tenha levado o homem a uma forma de registro. Possivelmente esta intenção aliada ao gesto de gravar impregnou de características específicas aquilo que iria estruturar uma "linguagem" bem distinta da do desenho, da pintura, da escultura, da fotografia e do cinema.
A troca, a comunicação e a divulgação no momento em que o homem se organiza socialmente, e especificamente com o advento dos primeiros núcleos urbanos, criaram a necessidade de encontrar um meio de multiplicação não só de texto como também de imagens. As implicações culturais e sociais que daí advieram são indiscutíveis.
A multiplicação de um original - a partir de uma matriz geradora veio romper a tradição valorativa da peça única, provocando uma renovação que iria afetar, inclusive o conceito e as avaliações estéticas. O valor de uma obra que aumenta ou diminui pelo fato de estar limitada a um possuidor privilegiado é quando muito, posta em questão. Esse valor na obra de multiplicação aumenta na medida do seu desdobramento, uma vez que patrocina a possibilidade de um convívio sem barreiras geográficas, sociais e culturais, com imagens, conceitos permanentemente transformadores da realidade. Assim a gravura vem expressar os anseios dos homens, sociais e culturalmente distanciados e diferenciados, consignados deste modo o seu alto sentido democrático.
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John Graz
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A0197
John Louis Graz (Genebra, Suíça 1891 - São Paulo SP 1980). Pintor, decorador, escultor e artista gráfico. Ingressa no curso de arquitetura, decoração e desenho da Escola de Belas Artes de Genebra em 1908, onde é aluno de Eugène Gilliard (1861 - 1921), Gabriel Vernet e Daniel Baud-Bovy (1870 - 1958). É discípulo também de Edouard Ravel, com quem aprende uma multiplicidade de técnicas e estilos. De 1911 a 1913, na Escola de Belas Artes de Munique, estuda decoração, design e publicidade com Carl Moos (1873 - 1959). Retorna à Escola de Belas Artes de Genebra, onde permanece de 1913 a 1915, período em que passa boa parte do tempo em companhia dos irmãos Regina Gomide (1897 - 1973) e Antonio Gomide (1895 - 1967). Viaja a Paris, onde se familiariza com o trabalho de Paul Cézanne (1839 - 1906) e entra em contato com o cubismo, o fauvismo e o futurismo. Recebe, por duas vezes, a Bolsa Lissignol e parte para estudos na Espanha. De volta a Suíça, realiza vários trabalhos como ilustrador. Em 1920, vem para o Brasil e, nesse mesmo ano, casa-se em São Paulo com Regina Gomide. Por intermédio de Oswald de Andrade (1890 - 1954) o casal passa a fazer parte da vida intelectual da cidade. Graz participa da Semana de Arte Moderna de 1922, expondo sete obras. No mesmo ano tem um de seus trabalhos publicados na revista Klaxon, 7ª edição. Em 1923, trabalha com o arquiteto Gregori Warchavchik (1896 - 1972). Projeta e executa a decoração de residências paulistanas, desenhando móveis, luminárias, afrescos, vitrais, maçanetas, banheiros e jardins. Torna-se sócio-fundador da Sociedade Pró-Arte Moderna - SPAM, em 1932. Ainda nos anos de 1930, produz inúmeras capas da revista Ilustração Artística do Brasil e forma o Grupo 7 com Regina Graz, Antonio Gomide, Elisabeth Nobiling (1902 - 1975), Rino Levi,Victor Brecheret (1894 - 1955) e Yolanda Mohalyi (1909 - 1978).
Comentário Crítico
Entre 1908 e 1911, John Graz freqüenta cursos de arquitetura, decoração e desenho na Escola de Belas Artes, em Genebra, onde é aluno de Eugène Gilliard (1861 - 1921) e Daniel Baud-Bovy (1870 - 1958). Em seguida, inscreve-se na Escola de Belas Artes de Munique e estuda com o artista gráfico Carl Moos (1873 - 1959). Em viagem a Paris, conhece o escultor Victor Brecheret (1894 - 1955). Em 1913, retorna a Genebra, onde finaliza seus estudos na Escola de Belas Artes. Recebe, por duas vezes, a bolsa Lissignol, que permite sua ida para a Espanha. Nesse país, realiza grandes paisagens, que revelam seu interesse pelas obras de Paul Cézanne (1839 - 1906) e, principalmente, de Ferdinand Hodler (1853 - 1918).
Em Genebra, desenha vitrais e faz ilustrações para cartazes publicitários. Trava amizade com o escritor Sérgio Milliet (1898 - 1966) e conhece Regina Gomide (1897 - 1973) e seu irmão, Antonio Gomide (1895 - 1967), colegas na Escola de Belas Artes. Noivo de Regina, vem ao Brasil em 1920 e casa-se. Integra-se ao grupo modernista de São Paulo, constituído por Anita Malfatti (1889 - 1964), Di Cavalcanti (1897 - 1976), Brecheret e Mário de Andrade (1893 - 1945), entre outros. Em 1922, participa da Semana de Arte Moderna com sete telas. Faz ilustrações para a revista Klaxon, primeiro periódico modernista.
A partir de 1923, executa projetos de decoração de residências: cria inúmeros vitrais e realiza design de móveis e peças como portas, fechaduras, luminárias, tapetes e afrescos. É considerado, com Regina e Antonio Gomide, um dos introdutores do estilo art déco em São Paulo. Trabalha com Gregori Warchavchik (1896 - 1972), recém-chegado ao país, decorando as casas projetadas pelo arquiteto russo. Em 1925, Graz apresenta em São Paulo móveis tubulares, feitos de canos metálicos e laminados de madeira, com formas geometrizadas. Dotado de grande conhecimento técnico e fabril, acompanha pessoalmente a produção das peças no Liceu de Artes e Ofícios, onde conta com a colaboração de Federico Oppido (1877 - 1950). É inovador na decoração de ambientes. Ao projetar os móveis, prevê sua distribuição no espaço e sua relação com painéis, vitrais e afrescos. A integração dos elementos é uma característica das casas decoradas por Graz: a mesma proposta estende-se dos painéis pintados aos móveis, objetos e iluminação. A residência Cunha Bueno (Jardim América) é exemplo do seu pioneirismo: para a decoração, o artista elabora inclusive o desenho geométrico do piso dos jardins. Infelizmente, a incipiência da indústria brasileira impossibilita a transformação dos protótipos de autoria de John Graz em utensílios produzidos em larga escala.
Nascimento/Morte
1891 - Genebra (Suíça) - 12 de abril
1980 - São Paulo SP - 27 de outubro
Vida Familiar
Casado com a pintora e decoradora Regina Gomide, irmã do pintor e escultor Antonio Gomide
Cronologia
Pintor, decorador, escultor, artista gráfico
ca.1908/1911 - É aluno de Eugène Gilliard, Gabriel Vernet e Daniel Baud-Bovy, no curso de arquitetura, decoração e desenho da Escola de Belas Artes de Genebra
1911/1913 - Estuda na Escola de Belas Artes de Munique (Alemanha), onde aprende desenho publicitário com Moss
1913/1915 - Estuda na Escola de Belas Artes de Genebra- recebe por duas vezes bolsa Lissignol para estudar na Espanha
1920 - Chega ao Brasil e passa a aviver em São Paulo, atraído por comentários de Sérgio Milliet e Regina Gomide
1922 - Faz ilustrações para a revista Klaxon em São Paulo
1922 - Participa da Semana de Arte Moderna
1923 - Passa a fazer decorações para os projetos do arquiteto Gregory Warchavchic
1924 - Realiza capas e vinhetas para o livro Domingo dos Séculos de Rubens Borba de Moraes
1925/1960 - Realiza inúmeros projetos de arquitetura de interiores para as famílias de Roberto Simonsen, família Leirner, Jafet, Caio Prado, Lunardelli, entre outros
1930 - realiza a decoração do cônsul da Suécia no Brasil, Realizou afgrescos, projetou jardins, pisos, murais, estofados e luminárias
1932 - Sócio-fundador da SPAM ao lado de outros artistas
1934/1940 - Participa do Grupo 7, com Victor Brecheret, Elisabeth Nobiling, Yolanda Mohalyi, Rino Levi, Regina Gomide e Antonio Gomide
1945 - Executa um vitral para o Hospital do Menino Jesus
1977 - Viaja para as Ilhas Gregas e Veneza (Itália). Realiza dezenas de croquis que mais tarde transforma em telas, com óleos e guaches
1978 - Viaja para a Espanha, conhece Sevilha e Granada
1979 - Condecorado pelo Governador de São Paulo Dr. Paulo Egydio Martins com a Medalha Mário de Andrade
Críticas
'Experiências de abstracionismo, com algumas construções geométricas, ou puramente informal, com a procura da matéria rica, densa, trabalhada. Bem cedo, porém, iria John Graz convencer-se de que esse gênero de pintura não se casava a sua índole pessoal, não correspondia aos seus anseios mais íntimos e profundos. É o próprio pintor quem nos diz que adora o que é vivo, o que respira e se movimenta. O seu caminho, portanto, é o do figurativismo, melhor, do figurativismo narrativo. Aqui é onde sua paleta se expande e não raro esplende. Como na excelente série de flagrantes de feira de São Joaquim, no Recife, com seus mercadores bizarros, o vendedor de pássaros, a graciosa moça da barraca de cesto, colocada no centro da tela, em elegante postura, entre faceira e arrogante- ou ainda a quadra de raparigas, tendo a Igreja Colonial por pano de fundo- como também a praça festiva, de colorido profundo e vivaz, que respira alegria, com seus balões de gás, tão bem integrados na multidão urbana. E muitas outras, de acento local, traduzindo com felicidade a ambiência, a atmosfera tropical'.
Paulo Mendes de Almeida
JOHN Graz. São Paulo: Galeria Documenta, 1974.
'Deverei confessar uma surpresa diante dos últimos quadros de John Graz. O artista entregou-se a total diversificação da temática, numa inteira liberdade de opções, que, parece-me nunca atingira. Estamos mesmo diante de um múltiplo repertório que é o que primeiramente causa impacto, pois dá o artista aos seus temas uma primazia inteira, tanto na captação do espaço e sua visualização dentro da tela, como na libérrima colocação, nesses retângulos, de figuras e coisas. Não que a pintura pouco conte, nestas alturas do tempo, para Graz. Ele efetivamente tem a sua palheta e esta é a sua marca, pela tonalidade expressa, toda feita de tons baixos. Assim, quando registra a natureza, a paisagem, a fauna, terras e objetos, condiciona-os a uma luz que não faz concessão alguma aos tropicalismos. Ao contrário, numa contenção vigilante, natural nele, o pintor se limita a prestar uma homenagem ao espetáculo cambiante da terra, da fauna e da flora, sem ceder um milímetro ao colorido. Seu verde é dele mesmo, como os seus terras, os seus vermelhos, os seus azuis. (...)'
Geraldo Ferraz
JOHN Graz: obras selecionadas. Apresentação de Geraldo Ferraz. São Paulo: R&R Camargo Arte, 1976.
'Todos os quadros apresentados por John Graz na exposição do Municipal tinham sido realizados ainda na Europa, em Geneve, sendo dois dentre eles (Paisagem na Espanha) feitos no decorrer de sua bolsa de estudos . Uma certa transfiguração hodierna transparece em suas telas Retrato do Ministro Gomide e, de maneira mais incisiva,Paisagem Suíça, onde é bem evidente o esquema de composição baseado em linhas paralelas horizontais. Uma forte estruturação está presente nas duas paisagens espanholas, sobretudo naquela que focaliza a ponte de Honda, onde a preocupação tectônica se casa com uma sensível alteração cromática, que ganha em dramaticidade. Indiscutivelmente, ao lado de Anita Malfatti, qualitativamente John Graz se colocava, nesta exposição, juntamente com Vicente do Rego Monteiro, como um dos pintores mais interessantes da Semana de Arte Moderna'.
Aracy Amaral
GALLAS, Alfredo G. (coord. ). 100 obras Itaú. Prefácio e apresentação Pietro Maria Bardi. São Paulo: Itaugaleria, 1985. 210 p. il. color.